Não é de hoje
que eu digo que a vida de professor é cheia de altos e baixos. São momentos
inspiradores que enchem nosso tanque de combustível e outros que parecem nos
levar a beira de uma pane. Esta semana não foi diferente.
Na
quarta-feira fui surpreendido ao entrar numa turma de sexto ano: “Não foi eu
que te dedei, professor!”. Tentei rapidamente entender o que estava acontecendo
e logo fui lembrado da aula do dia anterior. Matéria: a República romana. Além
de caracterizar tal regime político e compará-lo com a Monarquia, fiz um
paralelo com o nosso modelo republicano, tentando sempre desenvolver a
discussão (que começa na matéria da Grécia Antiga) em torno da cidadania. Em
meio a tudo isso, eis que surge a questão do ventilador quebrado na sala de
aula. E não era qualquer dia, tratava-se do dia mais quente do ano. Sensação
térmica superior a 40 graus, número idêntico ao de alunos na sala e... 1
ventilador... desde o início do ano letivo. Sol entrando na sala e suor
escorrendo pelo corpo. Cenário perfeito para uma reflexão sobre direitos e
deveres. Tentei debater a ideia de que ter os ventiladores funcionando era um
direito deles e um dever da escola. Era importante que eles reivindicassem
isso. Que tal conversar com os pais e pensar numa forma de manifestação? Esta
foi a pergunta final da aula.
Claro
que eu não sabia de nada. Era o dia que eu chegava apenas para a 4ª aula e todo
o desespero dos alunos não fazia sentido pra mim. No horário da entrada, parte
da turma se recusou a subir para a sala de aula enquanto o ventilador não
estivesse funcionando. Consequência óbvia: direção. Lá, se travou o seguinte diálogo
relatado pelos alunos:
- Quero saber por que vocês não
querem subir.
- Estamos aqui para pedir nossos
direitos. O ventilador da nossa sala está quebrado desde o início do ano...
- E vocês acham que têm direitos?
Olha, agradece porque não vou dar uma suspensão pra vocês... Quem teve essa
ideia?
Agora
fazia sentido o pavor dos alunos quando entrei na sala. Mas tratei de
acalmá-los e disse que não havia problema algum. Na verdade, por dentro estava
cheio de orgulho dos meus pequenos “revolucionários”. Não sei se eles se lembrarão
um dia quem eram os etruscos ou os italiotas, mas se recordarão, certamente, do
dia em que foram corajosos e ousaram lutar por seus direitos. Fui pra casa em
paz!
Dia
seguinte, outra escola. Espero na sala dos professores a hora de subir. Chega
uma colega e começa a reclamar do feriado do dia 20 de novembro (pra quem não é
do Rio de Janeiro – Dia da Consciência Negra, homenagem ao Zumbi dos Palmares).
“Por que não cria o Dia da Consciência Branca?”. Nesse momento, um outro colega
coloca lenha na fogueira e lembra da questão das cotas raciais. Me posiciono e
justifico a inclinação em apoiar tais medidas. Daí em diante foi uma série de
argumentos conservadores e racistas do tipo: “Se os negros (na verdade, ela
dizia ‘escuros’) não conseguem é porque não querem. O mundo é cheio de
possibilidades.” Sorte minha que na sala havia uma professora de Sociologia,
que se somou a mim na tentativa fracassada de argumentar com quem não está
disposto a ouvir. Não aguento por mais de 2 minutos. Subo antes do sinal bater.
Sento na minha mesa e espero os alunos chegarem. Em meio às cadeiras vazias
ainda podia ouvir o eco daquela discussão sem sentido. Uma professora?
Depois
de um dia de orgulho dos meus alunos, senti nojo de alguns colegas. Em 24
horas, tive esperança no ser humano e perdi um pouquinho também. Definitivamente, gangorra
nunca foi meu brinquedo preferido.
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