domingo, 30 de agosto de 2015

Teatro na escola: o que aprendi?

                Existe muita coisa errada na Educação. Nada que não tenha sido exaustivamente discutida por muitos especialistas. Como não considero um deles, vou apenas fazer algumas considerações baseadas em ideias que tenho há algum tempo e que foram reforçadas com uma experiência maravilhosa que tive em uma das minhas escolas.
                Pra início de conversa: escola não é fábrica! Portanto, não devemos comprar o modelo industrial para produzir seres moldados conforme o padrão do mercado. Retiramos a humanidade da escola (se é que algum dia ela esteve presente) e viramos formadora de especialistas. Não importa o que ele vai fazer com esse conhecimento, basta tê-lo. Será?
                Uma das maiores atrocidades da História (para alguns – a maior) foi fruto de uma sociedade extremamente organizada, disciplinada e muito bem escolarizada. Os alemães eram grandes especialistas. Tanto é verdade que conseguiram exterminar 6 milhões de judeus com uma velocidade e precisão digna de um país altamente desenvolvido.
                Estamos formando engenheiros que são perfeitos conhecedores das ciências exatas, mas que é capaz de construir um prédio com areia da praia. Os políticos que hoje assombram o país com escândalos de corrupção passaram pela escola e aprenderam direitinho as lições de Português. São belos oradores. E os médicos? 10 em ciências! Que formidável! Mas é o mesmo que assina o ponto no Hospital público e vai embora correndo ganhar mais dinheiro na sua clínica particular.
                Sei que você pode pensar: “Mas essas questões éticas são responsabilidade da família”. Sim, concordo plenamente. Mas o que fazer quando ela não cumpre o seu papel? A escola deve simplesmente ignorar? Se preocupar apenas com o conteúdo curricular?
                Desenvolver o aspecto cognitivo é tarefa primordial da escola, mas sem valores humanos não temos uma sociedade melhor. E é papel da escola buscar uma sociedade melhor. Como fazer isso?
                Deixar o aluno sentado em uma cadeira por horas e depois mandar ele pra casa com certeza não é o caminho. A escola supervalorizou a sala de aula. Daí estarmos com uma legião de alunos entediados, torcendo para ter uma aula vaga. Só assim ele tem um momento de liberdade, para movimentar o corpo, viver experiências.
                A escola aprisiona os corpos dos alunos e eles resistem. Como pássaros, só querem voar. Mas por que não voar dentro da escola?
                O colégio dos meus sonhos tem muito mais do que salas de aula. Nela há um auditório de música, onde os alunos podem aprender diversos instrumentos e soltarem suas vozes em lições de canto. Dentro do ginásio, existem diversas modalidades esportivas. É só escolher uma: tem um time de futebol, outro de basquete, vôlei, handebol, judô, ginástica, tênis de mesa... Na sala de artes encontramos quadros sendo pintados, desenhos ilustrando belas histórias e até mesmo pequenas esculturas sendo moldadas.
                E, é claro, um belo espaço para um grupo de Teatro, onde os alunos podem explorar sua criatividade, o convívio em grupo, o controle sobre seu corpo, sua voz, e tudo isso sem deixar de estudar, pois o texto, a temática, o cenário, a música, o figurino e vários outros elementos do universo teatral são frutos de muito estudo.
                Sei que foi uma introdução longa, mas tudo isso que escrevi até agora é apenas para mostrar pra vocês como estou feliz e realizado de ter conseguido montar uma peça teatral em uma das minhas escolas.
                O trabalho que fizemos em poucos meses de preparação e ensaios foi muito maior do que todos nós imaginávamos, inclusive eu. Começamos só com uma ideia e em pouco tempo estávamos com um espetáculo, em todos os sentidos.
                A peça tratava do Holocausto, mas usava a intolerância do mundo atual como gancho inicial e reflexão final. Foram 12 alunos envolvidos, que aceitaram ficar além do horário sem ganhar nenhum décimo de nota em troca. Eu fiz o mesmo. Passei horas, antes destinadas ao descanso, dirigindo os ensaios e cuidando de toda a produção da peça, sem ganhar um centavo a mais de salários. Pelo contrário, parte dele foi usado em alguns momentos, pois não queria pedir nada à escola.
             Meu objetivo era simples: queria mobilizar os alunos, professores, equipe pedagógica e direção para provar que fazer arte na escola não é uma atividade complementar. Isso deve ser incentivado com a mesma importância que as disciplinas tradicionais. Nada mais convincente do que mostrar uma experiência de sucesso. E ela aconteceu!
                Meus alunos fizeram várias apresentações, levando a mensagem da peça para cerca de 500 pessoas, entre pais, colegas, professores e funcionários. O impacto foi impressionante. O espetáculo emocionou a todos, inclusive nós que proporcionamos a existência dele.
             Não tenho mais palavras para agradecer esses meus queridos alunos que entraram nesse barco comigo sem imaginar que chegaríamos em terra firme. Tenho orgulho de cada um deles, desde os que chegaram sem conseguir falar uma palavra, passando pelos que choravam só de pensar em falar na frente das pessoas até os mais habilidosos que fizeram tudo com uma leveza de profissional, todos eles são inesquecíveis.
          O Teatro, portanto, me proporcionou não só uma realização profissional. As horas de convivência desenvolveram uma admiração mútua, uma amizade sincera e um sentimento de ter feito parte de algo que não vai ser esquecido.

              Após esta experiência, pude ver que meus pupilos são mais humanos. Eu me tornei mais humano. A escola se abriu para a possibilidade de ser mais humana. Missão cumprida!


Nenhum comentário:

Postar um comentário